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The registration of intangible cultural heritage: the IPHAN and IEPHA’s practices

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Da Silva, Ana Paula; Da Silva, Paulo Sérgio. O registro do patrimônio cultural imaterial: as práticas do IPHAN e do IEPHA/MG. GeoGraphos. [En línea]. Alicante: Grupo Interdisciplinario de Estudios Críticos y de América Latina (GIECRYAL) de la Universidad de Alicante, 2 de junio de 2016, vol. 7, nº 87 (7), 16 p. [ISSN: 2173-1276] [DL: A 371-2013] [DOI: 10.14198/GEOGRA2016.7.87(7)].

<http://web.ua.es/revista-geographos-giecryal>

Vol. 7. Nº 87 (7) Año 2016

O REGISTRO DO PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL: AS

PRÁTICAS DO IPHAN E DO IEPHA/MG

Ana Paula da Silva

Doutoranda em História – Bolsista CAPES/CNPQ

Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Faculdade de Ciências Humanas e Sociais (UNESP/FCHS)

Franca, São Paulo – Brasil

Correio eletrônico: anapaulahistoria@yahoo.com.br

Paulo Sérgio da Silva Doutor em História

Universidade Federal de Uberlândia (UFU) Uberlândia, Minas Gerais – Brasil Correio eletrônico: paulounesp@yahoo.com.br

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2 RESUMO

Patrimônio cultural é tudo aquilo que possui significado social e representa identidades, sendo dividido em duas principais categorias: material e imaterial. O reconhecimento deste último foi construído ao longo de um processo de maturação, ampliação de debates, legislação e ação de órgãos públicos nacionais e internacionais. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 incorporou, ao lado do patrimônio material, as diversas formas de expressão e os modos de criar, fazer e viver, como patrimônio imaterial, adotando novos instrumentos de proteção aos bens culturais: o registro e o inventário. Entretanto, somente pelo Decreto 3.551/2000 é que o registro do imaterial foi definitivamente normatizado. Paulatinamente, ocorreu a descentralização da legislação e das políticas públicas, que passaram a ser compartilhadas por União, Estados e Municípios e, nesse sentido, um caso peculiar na gestão do patrimônio cultural ocorreu no estado de Minas Gerais, no qual o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA/MG) assumiu um valioso papel na preservação do patrimônio cultural, onde as ações municipais voltadas ao patrimônio cultural no Estado contam com repasses financeiros, via distribuição do Imposto Sobre Mercadorias e Serviços (ICMS). Esse cenário propiciou um campo para a reflexão e debate sobre o papel e a função desse órgão estadual frente às práticas de identificação, valorização e promoção do patrimônio imaterial de Minas Gerais.

Palavras-chave: patrimônio cultural imaterial, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA/MG), legislação brasileira de patrimônio cultural.

EL REGISTRO DEL PATRIMONIO CULTURAL INMATERIAL: LAS PRÁCTICAS DEL IPHAN Y DEL IEPHA/MG

RESUMEN

Patrimonio cultural es todo lo que tiene un significado social y representa identidades, dividiéndose en dos categorías principales: tangible s e intangibles. El reconocimiento de este último fue construido al largo de un proceso de maduración, expansión de debates, legislación y acción de las entidades públicas nacionales e internacionales. En Brasil, la Constitución Federal de 1988 ha incorporado, junto con el patrimonio material, las diversas formas de expresión, formas de crear, hacer y vivir, como patrimonio inmaterial, adoptando nuevos instrumentos para la protección de los bienes culturales: el registro y el inventario. Sin embargo, sólo por el Decreto 3.551/2000 es que el registro del inmaterial fue definitivamente regulado. Poco a poco se produjo la descentralización de la legislación y de las políticas públicas, que se tornaron compartidas entre los gobiernos federal, estatal y municipal y, en ese sentido, un caso peculiar en la gestión del patrimonio cultural ocurrió en la provincia de Minas Gerais, cuyo Instituto Estatal de Patrimonio Histórico y Artístico (IEPHA/MG, acrónimo en portugués) tuvo participación importante en la conservación del patrimonio cultural, donde las acciones municipales para el patrimonio cultural en la provincia dependen de las transferencias financieras, a través de la distribución del Impuesto sobre Mercancías y Servicios (ICMS, acrónimo en portugués). Este escenario proporciona reflexión y debate sobre el rol y la función de este organismo estatal referente a las prácticas de identificación, valoración y promoción del patrimonio inmaterial de Minas Gerais.

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Palabras clave: patrimonio cultural inmaterial, Instituto del Patrimonio Histórico y Artístico Nacional (IPHAN), Instituto Estatal del Patrimonio Histórico y Artístico de Minas Gerais (IEPHA / MG), legislación brasileña sobre el patrimonio cultural.

THE REGISTRATION OF INTANGIBLE CULTURAL HERITAGE: THE IPHAN AND IEPHA’S PRACTICES

ABSTRACT

Cultural heritage is everything that has social meaning and represents identities, and can be divided into two main categories: tangible and intangible. The recognition of the intangible cultural heritage was built over a maturation process, expansion of debates, legislation and action of national and international public bodies. In Brazil, the 1988 Federal Constitution has incorporated, together with the tangible heritage, the various forms of expression, ways of creating, making and living, as intangible heritage, adopting new instruments for protecting cultural goods: the registry and the inventory. However, only by the Decree 3.551/2000 the intangible’s registration was definitely regulated. Gradually, there was the decentralization of legislation and public policies, and they have been shared between the Federal, State and Municipal governments and, in this sense, a peculiar case in the management of cultural heritage took place in the state of Minas Gerais, in which the State Institute of Historical and Artistic Heritage (IEPHA/MG, acronym in Portuguese) had a valuable role in preserving the cultural heritage with, where the municipal actions for cultural heritage in the State rely on financial transfers, via distribution of Tax on Goods and Services (ICMS, acronym in Portuguese). This scenario provided a field for reflection and debate on the role and the function of this state agency with respect to the practices of identifying, appreciating and promoting the intangible heritage of Minas Gerais.

Keywords: intangible cultural heritage, Nacional Institute of Historic and Artistic Heritage (IPHAN), Minas Gerais’ State Institute of Historical and Artistic Heritage (IEPHA / MG), Brazilian legislation on cultural heritage.

INTRODUÇÃO

O patrimônio cultural de um povo pode ser classificado como as diversas peculiaridades que possuem significado social, representam e traduzem uma identidade, abarcando tanto as características pelas quais os indivíduos pertencentes a distintas etnias se aproximam ou se diferenciam em relação ao seu modo de vida e ao de outros. Essa concepção ampliou-se paulatinamente ao longo do século XX, tornando-se mais abrangente em relação aos conceitos e às categorias de bens materiais e imateriais.

O patrimônio cultural material, ou tangível, possui suporte físico que conserva e apresenta diretamente os seus valores culturais, encaixando-se nesse quesito tanto bens imóveis, como igrejas, casas, monumentos, fortes, edifícios, sítios arqueológicos, paisagens naturais que tenham significado cultural etc., quanto bens móveis, como por exemplo, utensílios de trabalho, obras de arte, documentos, vestuários, mobiliários, arquivos etc.

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O patrimônio imaterial, ou intangível, caracteriza-se por ter um suporte físico indireto, que sozinho não possui significado, mas torna-se ícone de representações, costumes, tradições ou saberes. É o caso do artesanato, dos instrumentos de artes visuais, das festas religiosas, celebrações, e mesmo os modos peculiares “do fazer”, tais como técnicas culinárias e de trabalho, bem como os lugares de sociabilidade. Esse entendimento é recente e fruto de um longo processo de maturação, resultado da ampliação do debate, da legislação e da ação de órgãos públicos nacionais e internacionais.

No Brasil, a institucionalização da legislação referente à proteção do patrimônio cultural nacional deu-se em 30 de novembro de 1937, quando foi promulgado o Decreto-Lei Nº 25, que organizou a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional e o colocou sob tutela do Estado, cabendo a um grupo estreito e vinculado ao movimento modernista da década anterior apreender e revalorizar os elementos constitutivos da identidade cultural do país. A criação do Serviço de Proteção Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) não foi um ato isolado, inseriu-se no processo de legalização, institucionalização e sistematização da preinseriu-sença do Estado na vida política e cultural do país.

Naquele momento, apenas o bens materiais foram contemplados, estabelecendo-se como mecanismo de proteção o tombamento, voluntário ou compulsório, cabendo ao Estado a responsabilidade de determinar quais os valores culturais inerentes ao bem que o tornava significativo para o grupo social ao qual ele reportava-se, limitando seu uso e/ou destinação, uma vez que tais bens não poderiam ser destruídos, demolidos ou mutilados sem autorização do órgão competente do tombamento, sob pena de multa em caso de infração.

O estabelecimento do tombamento possibilitou, até a década de 1970, a proteção legal de exemplares representativos da arquitetura civil e religiosa do período colonial brasileiro, reduzindo-se praticamente à conservação arquitetônica do monumento de “pedra e cal.” Somente a partir de 1975, através da criação do Centro Nacional de Referência Cultural (CNRC), dirigido por Aloísio Magalhães, a discussão acerca dos bens que representavam a cultura brasileira começou a ampliar-se. O novo órgão não se propunha a coletar bens, mas produzir referências, utilizando recursos interdisciplinares, que pudessem ser utilizadas no planejamento econômico e social para o desenvolvimento nacional, revitalizando a cultura brasileira. Se até aquele período as manifestações como artesanato, ritos e folguedos, os saberes e fazeres do povo eram objetos de interesse apenas dos folcloristas e etnógrafos, sendo preservados unicamente em coleções etnográficas dos museus nacionais, o CNRC procurou reelaborar essa relação entre erudito e popular, conferindo status de patrimônio histórico e artístico nacional às produções populares que incluíram especialmente as etnias indígena e afro-brasileira (FONSECA, 2009, p. 156).

Esse novo debate estimulou a ampliação do conceito brasileiro acerca da representatividade dos bens culturais e, associado a uma orientação antropológica, fomentou mudanças perceptíveis em relação ao patrimônio cultural imaterial. Na perspectiva normativa, a Constituição Federal de 1988 refletiu a ampliação do conceito de patrimônio cultural ao compreendê-lo como os bens de natureza material (móvel ou imóvel) e imaterial – categoria inserida pela primeira –, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referências à identidade, à ação ou à memória dos grupos formadores da sociedade brasileira. Ao lado dos conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico, foram incorporados na lista de bens culturais as formas de expressão, os modos de criar, fazer e viver, as criações científicas, artísticas e tecnológicas

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e as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais. Por fim, foram revalidados antigos instrumentos legais de proteção dos bens culturais, no caso o tombamento, e adotadas novas ferramentas: o registro e o inventário. A ampliação do conceito legal de patrimônio cultural teve o mérito de contemplar a diversidade da cultura brasileira ao incluir nessa acepção não somente as culturas dominantes na definição das trajetórias e espaços nacionais, mas também as culturas do campo, dos negros, índios, povos ribeirinhos, pescadores etc. Ao lado da arquitetura e dos ícones nacionais abriu-se espaço para a cultura cotidiana, o saber popular, os modos de fazer e os engendramentos sociais típicos das formações das identidades que compõem o mosaico cultural nacional. Progressivamente, as novas perspectivas legais consolidaram a elevação dos bens de natureza imaterial à categoria de patrimônio cultural e permitiram a regulamentação do registro que, somadas à descentralização da legislação e das políticas públicas, exercida de forma consorciada entre União, Estados e Municípios, abriram novas perspectivas para a promoção e a valorização do patrimônio cultural imaterial. Firmou-se o entendimento que patrimônio cultural imaterial, diversidade cultural e identidade são indissociáveis, reconhecendo-se que as transformações ocorridas nas formas de interação entre as comunidades e o seu meio sociocultural interferem nos seus modos de vida e na sua história. Em 1997 deu-se a primeira ação efetiva em favor do estabelecimento dos princípios do registro, embora isso já estivesse previsto desde a promulgação da nova Constituição. Naquele ano o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) promoveu um seminário internacional, na cidade de Fortaleza, estado do Ceará, que resultou no documento Carta de Fortaleza, que recomendou estudos para a regularização do registro enquanto meio de preservação e reconhecimento do patrimônio cultural imaterial. Tal orientação resultou, no âmbito do Ministério da Cultura, na criação de uma Comissão e de um Grupo de Trabalho de Patrimônio Imaterial (GTPI), composto por técnicos do IPHAN, da Fundação Nacional de Artes (Funarte) e do Ministério da Cultura. O trabalho desenvolvido nessa parceria permitiu a edição, em 04 de agosto de 2000, do Decreto Nº 3.551, que instituiu o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro e a criação do Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI).

Pelo Decreto 3.551/00 estipulou-se que o registro do patrimônio cultural imaterial se faz num dos seguintes livros: a) livro de registro dos saberes e modos de fazer enraizados no cotidiano das comunidades; b) livro de registro das festas, celebrações e folguedos que marcam ritualmente a vivência do trabalho, da religiosidade e do entretenimento; c) livro de registro das linguagens verbais, musicais, iconográficas e performáticas; d) livro dos lugares, destinado à inscrição de espaços comunitários, como mercados, feiras, praças e santuários, onde se concentram e reproduzem práticas culturais coletivas (art. 1º, § 1º, I a IV). Exige-se para o registro do bem de natureza imaterial a sua continuidade histórica e relevância nacional para a memória, a identidade e a formação da sociedade brasileira (art. 1º, § 2º), já que o decreto reporta-se às inscrições junto ao IPHAN.

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AS PECULIARIDADES DO REGISTRO DOS BENS IMATERIAIS, A METODOLOGIA UTILIZADA PELO IPHAN E A AÇÃO DO IEPHA/MG EM ÂMBITO ESTADUAL E MUNICIPAL

O registro corresponde à identificação e à produção de conhecimento sobre o bem cultural de natureza imaterial e equivale a documentar, pelos meios técnicos mais adequados, o passado e o presente de tais manifestações, com o objetivo de manter a memória desses bens culturais e de sua trajetória no tempo. De modo distinto do patrimônio material, em que a proteção via tombamento tem um caráter garantidor da integridade física, o registro não tem um caráter vigilante. No caso do patrimônio imaterial nenhum grupo é obrigado por meio do registro a manter um ritual, festa e/ou manifestação, a ação pública visa subsidiar tecnicamente iniciativas concretas, intervenções, investimentos e, especialmente, promover a sua difusão e divulgação (COSTA, CASTRO, 2008, p. 127-128).

O registro constitui-se em um importante instrumento legal de preservação, pois envolve o estabelecimento de medidas de salvaguarda no intuito de definir e organizar iniciativas que permitam a melhoria das condições socioambientais de produção, reprodução e transmissões dos bens imateriais registrados. Esse conjunto de ações e medidas sugeridas justifica o desenvolvimento de projetos e garante a execução de políticas públicas voltadas à proteção, salvaguarda e continuidade dessa manifestação. O registro permite o desenvolvimento de programas e ações governamentais e pode ser usado para estimular mobilizações reivindicatórias em prol da implantação de ações preservacionistas, capazes de garantir a profusão de manifestações culturais e criar condições para sua sustentabilidade, ou ainda servir para suscitar a consciência da preservação do bem por parte de agentes sociais.

O registro tem o escopo de promover a investigação, documentação, valorização, preservação e viabilidade do patrimônio imaterial. Reconhecem-se nesse processo como essencial à configuração do bem cultural as atribuições de valores a ele aferidas pelo grupo social que lhe dá suporte e efetividade, atributos essenciais na percepção da sua imaterialidade. Enquanto medida conservacionista o registro desloca o olhar, no campo das garantias e sustentabilidade, da imobilidade da noção monumental da “pedra e cal” para o reconhecimento e a valorização do dinamismo das manifestações culturais, focando na transformação, renovação e (re)significação dos sentidos simbólicos do patrimônio imaterial.

Em relação à metodologia para o registro de bens imateriais, no ano de 2000, após uma experiência piloto empreendido pelo Museu Aberto do Descobrimento da Bahia (MADE) e de um trabalho interdisciplinar, sob a coordenação do antropólogo Antônio Augusto Arantes, o IPHAN lançou o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC). Trata-se de um instrumento de identificação e documentação dos bens culturais imateriais, que passou a ser utilizado como preceito metodológico nos levantamentos, catalogações e dossiês de registro do patrimônio imaterial de qualquer categoria: saberes e modo de fazer; celebrações, festas e folguedos; linguagens e espaços em que se produzem as práticas culturais. Tal metodologia passou a ser adotada nos dossiês de registro promovidos ou submetidos ao IPHAN.

A metodologia preconizada pelo INRC tem a finalidade de identificar os bens culturais imateriais e produzir conhecimentos, materiais e documentos suficientes e adequados à promoção e salvaguarda de tais bens e a vida social onde eles se originam. Objetiva descrever cuidadosamente o bem cultural imaterial de modo a permitir uma adequada compreensão dos

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processos de criação, recriação e transmissão que o envolvem, assim como identificar os problemas que o afetam (IPHAN, 2006, p. 24).

Trata-se de um trabalho complexo que compreende: a) o levantamento inicial de informações e dados disponíveis sobre o ambiente social e da manifestação em si, incluso a sua identificação, descrição minuciosa e caracterização das referências culturais; b) O mapeamento das relações entre tais referências e outras culturas e comportamentos e a enunciação de sua origem, do processo de formação, produção, reprodução e transmissão cultural; c) a documentação, mediante preenchimento das fichas de identificação, incluso material áudio-visual e iconográfico do bem, análise do material pesquisado e inclusão dos resultados no banco de dados do inventário.

Em síntese, o registro de um bem cultural imaterial envolve: a seleção e um levantamento preliminar e, em seguida, a identificação e documentação do mesmo, ou seja, a montagem de um dossiê. Finalmente, esse corpus documental deve ser submetido à apreciação do órgão gestor do patrimônio cultural para análise, deliberação e demais procedimentos administrativos. No caso do IPHAN a análise desse material cabe ao Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, inclusive a inscrição do bem no livro correspondente caso o registro seja aprovado e, finalmente, a publicação do decreto nos meios oficiais de comunicação.

No plano da ação institucional no ano de 2000 o IPHAN lançou o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI), que regulamentou ações e propostas de fomento com o objetivo de custear projetos de identificação, reconhecimento, salvaguarda e promoção do patrimônio cultural imaterial. Tal programa permite ao IPHAN estabelecer parcerias e convênios com instituições públicas, universidades, organizações não governamentais, agências de desenvolvimento e organizações privadas, ligadas à cultura, à pesquisa e ao financiamento de inventários de expressões e manifestações populares com potencial para registro (LEAL, BORGES, 2012, p. 11).

Já no ano de 2004, fruto de uma política de salvaguarda estruturada e sistemática, foi estabelecido o Departamento do Patrimônio Imaterial (DPI), pelo Decreto Nº 5.040. Publicou-se o documento Os sambas, as rodas, os bumbas, os meus e os bois, que sistematizou os resultados obtidos até então e estabeleceu os princípios e ações a serem desenvolvidos a partir daí em relação ao patrimônio imaterial pelo órgão (IPHAN, 2010). No ano seguinte foi instituída a Câmara do Patrimônio Imaterial, junto ao Conselho do Patrimônio Cultural, instância que reúne representantes institucionais federais relacionados às políticas de preservação, organizações civis e especialistas. A essa cabe a decisão sobre a inscrição ou não do bem cultural, reconhecido como patrimônio imaterial, em um ou mais livros e a titulação como Patrimônio Cultural do Brasil (LEMOS JÚNIOR, BORTOLOZZI, 2013, p. 08-09). Finalmente, em 2010 foi lançado o Inventário Nacional da Diversidade Linguística (INDL), pelo Decreto Nº 7.387, destinado ao reconhecimento e a valorização das línguas significativas à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira. Conta-se até o presente momento com 28 bens patrimoniais imateriais registrados no Brasil pelo IPHAN, sendo o primeiro o Ofício das Paneleiras de Goiabeiras, em 2002, e o último a Festa de Nosso Senhor Bom Jesus de Bonfim, em 2013. Vide-se o quadro a seguir:

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Quadro 1. Bens Culturais Registrados pelo IPHAN (2002/2015).

Denominação do Bem Categoria Data do

registro Arte Kusiwa – Pintura corpora e arte gráfica Wajãpi Formas de Expressão 20/12/2002

Ofício das Paneleiras de Goiabeiras Saberes 20/12/2002

Samba de Roda do Recôncavo Baiano Formas de Expressão 05/10/2004

Círio de Nossa Senhora de Nazaré Celebrações 05/10/2004

Modo de fazer Viola-de-Cocho Saberes 14/10/2004

Ofício as Baianas de Acarajé Saberes 14/01/2005

Jongo no Sudeste Formas de Expressão 15/12/2005

Cachoeira de Iauaretè – Lugar sagrado dos povos indígenas dos Rios Uapés e Papuri

Lugares 10/08/2006

Feira de Caruaru Lugares 20/12/2006

Frevo Formas de Expressão 28/02/2007

Matrizes do Samba no Rio de Janeiro: Partido Alto, Samba de Terreiro e Samba-Enredo

Formas de Expressão 20/11/2007 Tambor de Crioula do Maranhão Formas de Expressão 20/11/2007 Modo Artesanal de Fazer Queijo de Minas Nas

regiões do Serro e das serras da Canastra e do Salitre/Alto do Paranaíba.

Saberes 13/06/2008

Ofício dos Mestres de Capoeira Saberes 21/10/2008

Rodas de Capoeira Formas de Expressão 21/10/2008

Modo de Fazer Renda Irlandesa, tendo como referência este ofício em Divina Pastora/SE

Saberes 28/01/2009 Toque dos sinos em Minas Gerais tendo como

referência São João de Rey e as cidades de Ouro Preto, Mariana, Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes

Formas de Expressão 03/12/2009

Oficio de Sineiro Saberes 03/12/2009

Festa do Divino Espirito Santo de Pirinópolis/GO Celebrações 13/05/2020 Sistema Agrícola Tradicional do Rio Negro Saberes 05/11/2010 Ritual Yaokwa do povo indígena Enawene Nawe Celebrações 05/11/2010

Festa de Sant`Ama de Caicó/RN Celebrações 10/12/2002

Complexo Cultural do Bumba-meu-boi do Maranhão

Celebrações 30/08/2011 Rirxókó: Expressão Artística e Cosmologica do

Povo Karajá

Formas de Expressão 25/01/2012 Saberes e Práticas Associados ao modo de fazer

Bonecas Karajás

Saberes 25/01/2012

Fandango Caiçara Formas de Expressão 29/11/2012

Festa do Divino de Paraty Celebrações 03/04/2013

Festa do Senhor Bom Jesus do Bonfim Celebrações 05/06/2013

Fonte: <http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/228>. Elaboração própria.

Como a competência para legislar e exercer políticas públicas em favor do patrimônio cultural não é exclusiva da União, mas compartilhada com os Estados e Municípios, nada impede que

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as unidades da federação e as administrações locais estabeleçam legislações próprias e procedam o registro de bens culturais de natureza imaterial, identificadores de sua memória e identidade, dentro das suas respectivas abrangências geográficas, sendo nesse aspecto um caso singular o estado de Minas Gerais, que instituiu o registro de bens culturais de natureza imaterial ou intangível pelo Decreto Nº 42.505, de abril de 2002. Coube ao Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA/MG) sistematizar, de forma similar ao IPHAN, os Livros de Registros de Saberes, Celebrações, Formas de Expressão e Lugares.

É importante destacar que o IEPHA é o responsável pelo registro dos bens patrimoniais imateriais significativos unicamente do estado de Minas Gerais e possui, até o momento deste trabalho, dois registros de bens de natureza imaterial: o modo de fazer do queijo artesanal da região do Serro, inscrito no Livro de Registro dos Saberes, e a Festa de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Chapada do Norte, inserida no Livro de Registro das Celebrações (IEPHA, 2015).

O pioneirismo de Minas Gerais está, sobretudo, na gestão pública do patrimônio cultural, no qual o IEPHA assumiu um valioso papel na preservação do patrimônio cultural, especialmente, a partir da edição da Lei Estadual Nº 12.040/1995, popularmente designada como Lei Robin Hood, que foi reformulada pela Lei Nº 13.803/2000 e, atualmente, encontra-se em vigor a Lei Nº 18.030/2009. A partir da autorização constitucional de que 25% do Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) pode ser repassado aos municípios conforme regulamentação estadual, Minas Gerais implantou uma legislação específica como estratégia de indução para obter dos governos municipais a adesão às políticas de patrimônio cultural, educação, saúde, meio-ambiente, produção de alimentos etc. Assim sendo, desde 1995 as ações municipais em favor do patrimônio cultural puderam contar/resultar com/no repasse de recursos via ICMS, graças à inserção no rol de critério da sua distribuição o item “Patrimônio Cultural”.

Nesse contexto, os municípios mineiros, visando obter os recursos correspondentes, passaram a implantar e desenvolver ações segundo as orientações definidas na Lei Robin Hood e orientadas, no caso do ICMS-Patrimônio Cultural, pelas determinações conceituais e metodológicas do IEPHA. Cabe a esse órgão editar resoluções e deliberações normativas disciplinando os programas e os procedimentos metodológicos para a implantação, a execução e a consolidação de políticas públicas e ações voltadas para o patrimônio cultural. Do ano de 1996 até o presente momento foram lançadas três resoluções e sete deliberações normativas, as quais definiram, revisaram e/ou aprimoraram as ações de proteção ao patrimônio cultural municipal, buscando maior efetividade e eficiência.

Ao IEPHA cabe ainda, anualmente, a análise detalhada e o julgamento da documentação enviada pelos municípios mineiros, comprobatórias da implantação e/ou da execução dessas políticas públicas, segundo os preceitos normativos estabelecidos pela própria autarquia estadual via resoluções e deliberações normativas. Ao final da apreciação é atribuída a cada município participante do processo uma pontuação que será utilizada como índice no cálculo do repasse do ICMS-Patrimônio Cultural no ano seguinte ao da avaliação do IEPHA. Ou seja, no final do ano de 2013 o município envia a documentação comprobatória dos programas e ações desenvolvidos naquele ano; essa documentação é analisada pelo IEPHA no ano de 2014, atribuindo uma pontuação ao município segundo os critérios de pontuação constantes

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do anexo II da Lei Nº 18.030/2009; a partir de janeiro de 2015 o município começa a receber repasses financeiros mensais em seu exercício fiscal. E assim, sucessivamente.

Implantada na legislação estadual o novo sistema de repartição do ICMS e definido a sistemática e as diretrizes metodológicas pelo IEPHA, compete identificar a adesão e participação dos municípios mineiros nesse novo modelo de gestão e promoção de políticas públicas culturais. Nesse sentido o gráfico abaixo é revelador:

Gráfico 1. Evolução da participação dos municípios do estado de Minas Gerais na distribuição do ICMS-Patrimônio Cultural (1996/2011).

Fonte: <http://www.iepha.mg.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=96&Itemid=151>. Elaboração própria.

Percebe-se por meio dos dados acima que a indução coordenada pelo governo de Minas Gerais, via recursos financeiros do ICMS-Patrimônio Cultural, fomentou e consolidou a municipalização da política de patrimônio cultural no estado. Formatou-se um sistema de gestão institucional mediante a hierarquização de aparatos institucionais municipais, constituídos segundo as peculiaridades locais e o comando estadual via IEPHA, que resultou na adoção de uma agenda técnica e política progressiva na área do patrimônio cultural, na medida em que as ações foram sendo disciplinadas, adaptadas e readequadas via resoluções e deliberações normativas do órgão estadual.

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Ademais, os municípios mineiros estimulados mediante compensação financeira a formularem e implantarem políticas públicas de patrimônio cultural vinculadas aos critérios estabelecidos pelo Instituto viram-se forçados à atualização conceitual de suas práticas preservacionistas. Revelador é o fato de que a partir de 2009, a Lei Robin Hood, na edição da Lei Nº 18030, em seu anexo II, passou a contemplar o patrimônio imaterial como atributo na pontuação para o repasse de ICMS. Tal situação levou à adoção de novas diretrizes do IEPHA aos municípios interessados em desenvolver ações relativas a tais bens, registros e/ou salvaguarda e pontuarem em relação a tanto.

Inserido o patrimônio imaterial no rol de bens culturais contemplados na distribuição financeira do ICMS, o IEPHA, através das Deliberações Normativas do Conselho Estadual do Patrimônio (CONEP), estabeleceu as diretrizes e a metodologia a serem observadas pelos municípios na montagem e no trâmite dos dossiês de registro de bens culturais imateriais. Atualmente, dentre os quadros de documentações exigidas pelo IEPHA para o município ser pontuado no critério ICMS-Patrimônio Cultural, encontra-se o Quadro VI – Registro de Patrimônio Imaterial, que condensa as normas a serem observadas para a composição dos registros realizados em âmbito municipal.

Segundo os termos da Deliberação Normativa em vigor (DN 02/2012) estipula-se que o patrimônio imaterial compreende as práticas, representações, expressões, conhecimentos, técnicas e seus lugares e produtos associados reconhecidos como integrantes do patrimônio cultural das comunidades e grupos. É exigido o dossiê de registro para cada um dos bens culturais imateriais protegidos, segundo uma estrutura previamente definida, contendo os seguintes itens: cópia da publicação da lei que cria o instituto do registro municipal; histórico do bem cultural, do município e de onde ocorre o bem cultural; depoimentos de no mínimo três pessoas (que vivenciam ou vivenciaram o lugar, o saber, a celebração ou a forma de expressão); descrição detalhada do bem cultural; produção de registros audiovisuais; registro fotográfico; análise do bem cultural (aspecto histórico, arquitetônico, religioso, social e político); plano de salvaguarda e valorização; ficha de inventário e bibliografia. Finalmente, exige-se como parte integrante do dossiê de registro cópia de toda a tramitação do processo legal, a saber: proposta de registro; estudo prévio que justifique o registro; atas das reuniões do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural; divulgação da decisão sobre o início do registro; inscrição no livro de registro e ficha técnica (IEPHA/MG, 2012, p. 67-75).

A incorporação da proteção aos bens imateriais na política estadual de patrimônio cultural, a partir de 2009, gerou na prática ações municipais no ano de 2010 que foram encaminhas, examinadas e pontuadas pelo IEPHA a partir do exercício de 2012. O mapeamento dos registros, realizados em âmbito municipal em Minas Gerais, com efetiva aprovação dos dossiês pelo IEPHA, ainda estão em fase de levantamento pelos autores. As informações ora disponíveis advêm da Fundação João Pinheiro e do Centro de Políticas Públicas e dão conta dos seguintes números: 07 processos de registro municipal efetivados em 2011; 67 em 2012 e 137 em 2013, totalizando 187 bens registrados nesse período de três anos (BIONDINI, STARLING, CARSALADE, 2014, p. 17-19). Foi identificada na relação entre os municípios que pontuaram no ICMS-Patrimônio Cultural, em sentido geral, e aqueles que conseguiram obter pontuação relativa a bens imateriais (seja pelo processo de registro e/ou por execução de ações de salvaguarda) a seguinte composição:

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Quadro 2. Número de municípios do estado de Minas Gerais com pontuação referente ao ICMS-Patrimônio Cultural na categoria de bens imateriais (2012/2015). Ano do Exercício Municípios pontuados – ICMS:

critério Patrimônio Cultural

Pontuou em ações relacionadas a Patrimônio Imaterial 2012 723 154 2013 639 193 2014 527 143 2015 655 188 Fonte: <http://www.iepha.mg.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=96&Itemid=151>. Elaboração própria.

Os dados preliminares indicam que a adesão dos municípios no plano das políticas e ações patrimoniais voltadas ao patrimônio imaterial, de recente inclusão, é expressiva e consistente. Demonstram a formatação e a possível consolidação de uma Política de Estado também em relação a essa tipificação patrimonial. Em seu conjunto, a forte adesão e as ações culturais implantadas e desenvolvidas nos municípios mineiros demonstram o sucesso da política de patrimônio e da agenda pública em relação à identificação, proteção, promoção, salvaguarda e valorização dos bens culturais materiais e imateriais.

Evidentemente, existem problemas que precisam ser trabalhados, tais como: o caráter meramente financeiro de boa parte dos municípios em desfavor de um compromisso efetivo com uma política de proteção, salvaguarda e valorização do patrimônio cultural (BIONDINI, 2014, p. 20); o surgimento e a proliferação de empresas de consultorias, muitas vezes com ex-técnicos do próprio IEPHA, atuando como principais atores na implantação de ações e programas estranhos às reais dimensões culturais dos municípios e à efetiva participação social na compreensão e execução das atividades; rupturas nas práticas, projetos, ações e na gestão e condução das políticas municipais voltadas ao patrimônio cultural em decorrência de mudanças de equipe técnica e de prefeitos. Contudo, tais aspectos não devem turvar a visão e as evidências do pioneirismo e dos inúmeros resultados positivos de tal política patrimonial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após o conhecimento da legislação e sobre as práticas institucionais vê-se que o conceito de patrimônio cultural foi apropriadamente estendido e passou a integrar em seu domínio todas as faces da cultura, inclusive aquelas de caráter imaterial, as quais dotadas de características particulares constituem-se em importantes índices socioculturais. A superação da memória de pedra e cal ou de tijolos e cimento foi um importante salto qualitativo que abriu novas perspectivas para a preservação e conservação do patrimônio cultural brasileiro.

Contudo, é necessário cuidado para que essa busca pelo “patrimônio cultural”, tão popular na contemporaneidade, não resulte em ações marcadas pela superficialidade e pela falta de conteúdo e/ou na relativização conceitual. Não raras vezes palavras como patrimônio, memória coletiva e/ou identidade cultural são apresentadas de forma vaga, eivadas do seu real sentido como expressões de ordem em programas culturais usualmente repetitivos e equivalentes entre si, evidenciando o esvaziamento de seus sentidos (HUYSSEN, 2000, p. 09-34; ARANTES, VAINER, MARICATO, 2000, p. 67-68).

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Para além dos usos dos bens culturais enquanto obras que proporcionam aos observadores “saber e prazer” e/ou o processamento, a distribuição e o consumo dos “produtos culturais” (CHOAY, 2001, p. 211) é necessário focar no incentivo e na participação dos cidadãos e dos agentes culturais nos processos de identificação, difusão e proteção do patrimônio cultural material e na valorização e fomento às práticas culturais imateriais. Nunca é demais lembrar que o valor das referências culturais não se resume e/ou se esgota em identificações técnicas, definidas a partir de critérios de ofícios. Pelo contrário, encontra-se diretamente vinculado ao seu sentido social, enquanto testemunho histórico e signo identitário cujo significado relaciona-se, especificamente, ao grupo social ao qual tais referências reportam-se.

Nesse contexto o registro, com as suas respectivas peculiaridades, exigências, finalidades e objetivos, tanto no campo normativo quanto no contexto das políticas e ações públicas, aparece como uma novidade promissora, em âmbito federal, estadual e municipal, abrindo novas dimensões de atuação para agentes públicos, técnicos e profissionais e, nesse particular, a atuação do IEPHA/MG é reveladora.

É preciso esclarecer as comunidades detentoras dos bens culturais imateriais das finalidades do registro, é preciso ir além de simples aval e as estimular na apropriação efetiva de seu patrimônio imaterial. Para a eficaz salvaguarda e valorização do patrimônio cultural imaterial é fundamental superar as falas e os procedimentos técnicos burocráticos. Há de se recuperar e fomentar a participação, o envolvimento e a articulação dos atores sociais e culturais na identificação, proteção, preservação, salvaguarda, promoção e valorização dos bens culturais imateriais, pois, sem isso, o registro em si não passará de mera documentação e de um título (CORA, 2014, p. 13-14).

O atributo da imaterialidade que caracteriza o patrimônio imaterial tem por fundamento o sentimento de pertencimento a dado grupo social, o qual é efetivamente o produtor de determinado saber, se expressa de dada forma, celebra em dado ambiente e se apropria de determinados lugares como símbolo de sua cultura. Ou seja, é o saber, o fazer, o sentir, o celebrar, o apropriar-se, que atribuem sentido e significado tornando o bem cultural digno de reconhecimento como patrimônio imaterial. O que o legitima e o fundamenta não são as determinações estatais e/ou legislativas, mas a história e o viver que o inserem em dado grupo social, nos seus saberes, formas de expressão, celebrações, lugares, enfim, em seu espaço e vivências sociais.

Para além do mero registro deve-se facilitar o processo interpretativo do patrimônio cultural imaterial mediante a inclusão da comunidade no processo de forma a democratizar o conhecimento, a conscientização e a sua fruição. Tal inclusão é a garantia para a sustentabilidade desse bem, seja no que se refere tanto à gerência, quanto aos usos desse patrimônio (MENESES, 2009, p. 13), a sua proteção, salvaguarda e valorização. Os desafios estão lançados em âmbito nacional, via IPHAN, e em âmbito estadual e municipal, via IEPHA/MG.

Consolida-se, portanto, no Brasil contemporâneo um amplo espaço para a adoção e a execução de políticas e ações públicas em favor do patrimônio cultural em geral e em relação ao patrimônio cultural imaterial em específico. De outra parte, tal cenário traz o desafio de estudos e reflexões sobre tais práticas, suas sistemáticas, acertos e descaminhos, analisando-as in loco, tanto em âmbito nacional, estadual e/ou municipal; estimula o desenvolvimento de

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pesquisas em escalas regionais e/ou locais, relacionadas à cultura popular, grupos sociais e/ou minorias étnico raciais; incita indagações acerca dos limites/possibilidades e aplicabilidades do conceito de patrimônio cultural imaterial e do instituto do registro e incita o pensar sobre a diversidade dos saberes, lugares, celebrações e formas de expressões que formam esse grande mosaico cultural que são os “brasis”.

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